O setor de transporte rodoviário de cargas é um dos pilares da economia brasileira, sendo responsável por escoar grande parte da produção nacional. Dentro desse cenário, tanto as empresas transportadoras, como os transportadores autônomos desempenham um papel crucial, pois são o elo que faz a junção entre as diversas etapas da cadeia produtiva. No entanto, historicamente, enfrentaram um problema recorrente: a inclusão do custo do pedágio no valor do frete, transferindo-lhes um ônus financeiro que deveria ser arcado pelo contratante do serviço.
Foi nesse contexto que surgiu a Lei n.º 10.209/2001, conhecida como a Lei do Vale-Pedágio, cujo objetivo principal é proteger o transportador rodoviário de cargas, garantindo que ele não seja onerado com os custos dos pedágios durante a execução de suas atividades.
Antes da vigência da Lei n.º 10.209/2001, era comum que os custos dos pedágios fossem embutidos no valor do frete, transferindo ao transportador a responsabilidade de pagar por esses encargos ao longo da viagem. Essa prática gerava dois grandes problemas, sendo o primeiro o impacto financeiro desproporcional, pois os pedágios representavam uma parcela significativa do custo total da operação, reduzindo drasticamente a margem de lucro dos transportadores. O segundo, a falta de transparência, uma vez que a inclusão dos pedágios no frete dificultava o controle sobre os valores efetivamente destinados a esses custos, criando incertezas e possibilitando abusos na relação contratual.
A implementação da Lei do Vale-Pedágio trouxe maior clareza e justiça a essa relação, ao estipular que o contratante do serviço de transporte deve fornecer previamente ao transportador os valores destinados ao pagamento dos pedágios, sendo que esse fornecimento não pode ser efetuado em dinheiro, mas sim de forma específica, devidamente homologada pela ANTT. Com isso, os transportadores passaram a ter a garantia de que poderiam realizar o trajeto contratado sem comprometer seus recursos pessoais ou financeiros.
Com relação à forma de cumprimento da Lei e à responsabilidade do contratante, a legislação é clara ao estabelecer que o vale-pedágio deve ser entregue ao transportador antes do início da viagem, em um formato específico que facilite seu uso, sempre por meio eletrônico. Esse mecanismo assegura que o transportador tenha acesso direto aos valores necessários para o pagamento dos pedágios, independentemente de seu fluxo de caixa.
Caso o contratante descumpra essa obrigação de fornecer o vale-pedágio na forma especificada em Lei, incluindo o valor do pedágio no frete ou efetue seu pagamento em dinheiro, ele estará sujeito a sanções administrativas e a uma indenização devida ao transportador equivalente a duas vezes o valor do frete contratado.
Trata-se de uma multa pesada para o contratante do frete, contudo sua validade já foi discutida e assegurada pelo Supremo Tribunal Federal, e tem o objetivo de: i) desencorajar práticas abusivas, pois funciona como um instrumento de dissuasão, obrigando os contratantes do frete a cumprirem a lei sob pena de enfrentarem um prejuízo financeiro expressivo; ii) compensar os transportadores, pois são eles quem arcam indevidamente com os custos do pedágio e sofrem prejuízos diretos, como a redução de sua margem de lucro e o impacto no seu planejamento financeiro; iii) garantir o equilíbrio contratual, pois ao impor penalidades severas, a legislação promove maior equilíbrio nas relações entre contratantes e transportadores, assegurando que a parte mais vulnerável – no caso, os transportadores – seja devidamente protegida.
Os tribunais judiciais brasileiros têm reconhecido o direito dos transportadores à multa compensatória, especialmente em situações em que fica comprovado que o contratante descumpriu a obrigação de fornecer o vale-pedágio ou tentou mascarar o custo ao incluí-lo no frete. Contudo, é importante que os transportadores se atentem aos prazos, pois a lei estabelece um prazo prescricional de 12 meses para se promover judicialmente a cobrança da indenização do dobro do valor de cada frete.
Seja no âmbito judicial ou extrajudicial, as transportadoras e os transportadores autônomo tem à sua disposição meios efetivos para exigir o cumprimento de seus direitos e evitar prejuízos decorrentes da omissão ou negligência dos contratantes. Assim, a lei não apenas corrige distorções históricas, mas também promove a valorização e a sustentabilidade dessa categoria essencial para a economia brasileira, e promove um ambiente mais justo e transparente no setor de transportes.
Helder Eduardo Vicentini – advogado, sócio do escritório Motta Santos & Vicentini Advocacia Empresarial
Nenhum comentário. Seja o primeiro a comentar!